quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Sobre a superficialidade

Pergunta: Como uma pessoa superficial pode se tornar séria?

Krishnamurti: Em primeiro lugar, temos de estar cônscios de que somos superficiais, não é? O que significa ser superficial? Em essência, ser dependente. Depender de estimulação, de desafios, de outra pessoa, de certos valores, experiências, lembranças, tudo isso contribui para a superficialidade. Quando dependo de ir à igreja todos os domingos de manhã a fim de ganhar ânimo, de ser ajudado, isso não faz de mim uma pessoa superficial? Se preciso executar certos rituais para manter meu senso de integridade, ou para recuperar a sensibilidade que tive um dia, isso não faz de mim uma pessoa superficial? Não estou sendo superficial quando me entrego a um país, a um plano, ou a um grupo político? Sem dúvida, todo esse processo de dependência é uma fuga de mim mesmo. Essa identificação com algo maior é a negação do que sou. Mas não posso negar o que sou. Preciso compreender o que sou, não tentar me identificar com o universo, com Deus, com um partido político ou qualquer outra coisa. Tudo isso leva ao pensamento superficial, e daí vem uma atividade perversa, seja em escala mundial ou individual.

Reconhecemos que estamos fazendo essas coisas? Não, não reconhecemos, justificamos nosso comportamento. “O que vou fazer, se não fizer isso?″, nos perguntamos. “Ficarei pior do que estou, minha cabeça explodirá. Agora, pelo menos, estou lutando por algo melhor″. Quanto mais lutamos, mais superficiais nos tornamos. É preciso ver isso, não é? Ver o que somos é uma das coisas mais difíceis que existem. Ver o que sou, reconhecer que sou estúpido, superficial, limitado, ciumento, é algo muito difícil. Mas, se consigo ver, isso já é um começo. É óbvio que uma mente superficial é uma mente que foge do que ela é, e não fugir requer séria investigação, a negação da inércia. No momento em que sei que sou superficial, um processo de aprofundamento, desde que eu não interfira. Se a mente diz “Sou trivial e vou investigar isso, vou compreender essa minha trivia1idade″, há a possibilidade de uma transformação. Mas, se ela, reconhecendo que é trivial, tenta deixar de ser, lendo, conhecendo pessoas, viajando, lançando-se numa atividade incessante, como um macaco, continuará sendo trivial.

Como você pode ver, uma revolução verdadeira só acontece quando abordamos o problema de forma correta. Essa abordagem correta nos dá uma enorme confiança que, eu lhe garanto, move montanhas, as montanhas de nossos preconceitos e condicionamentos. Estando cônscio de que a mente é superficial, não tente torná-la profunda. A mente superficial não pode conhecer grandes profundidades, por mais que se encha de conhecimento, de informações, fazendo tudo o que uma mente superficial ativa faz. Mas, se você sabe que é superficial, raso, se tem conscientização dessa superficialidade e observa todas as suas atividades, sem julgamento, sem condenação, ela desaparece, sem que você faça qualquer coisa para isso. Esse processo requer paciência e vigilância, mas nunca o desejo de alcançar um resultado. Só uma mente superficial deseja realização, busca um resultado.

Quanto mais cônscio você estiver desse processo, mais conhecerá as atividades da mente, mas é preciso observá-las sem tentar interrompê-las, porque, no momento em que tiver um fim em vista, voltará a se enredar na dualidade do “eu” e o “não eu”, o que fará o problema continuar.


Texto selecionado por Hilda Garcia para estudo em Loja realizado em  04.11.14.

"Nenhum Teósofo, do menos instruído ao mais culto, deve pretender a infalibilidade no que possa dizer ou escrever sobre questões ocultas" (Helena P. Blavatsky, DS, I, pg. 208). A esse propósito, o Conselho Mundial da Sociedade Teosófica é incisivo: "Nenhum escritor ou instrutor, a partir de H.P. Blavatsky tem qualquer autoridade para impor seus ensinamentos ou suas opiniões sobre os associados. Cada membro tem igual direito de seguir qualquer escola de pensamento, mas não tem o direito de forçar qualquer outro membro a tal escolha" (Trecho da Resolução aprovada pelo Conselho Geral da Sociedade Teosófica em 23.12.1924 e modificada em 25.12.1996.

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