sexta-feira, 29 de maio de 2015

5000 anos de Advaita: Não é o corpo

Por Dennis Waite

A noção de que "eu sou o corpo" é a identificação mais básica. Isto é bastante compreensível quando "eu estou doente", uma vez que a dor e o desconforto têm tendência a perturbar o pensamento claro. Mas gastar enormes quantias de dinheiro nas últimas modas de modo que "eu pareça bonito" ou ainda mais dinheiro em injeções ou cirurgia para tentar burlar o processo de envelhecimento, deveria fazer-nos questionar se algo deu errado com o nosso pensamento. O corpo, afinal de contas, nada mais é do que a comida que temos comido, reprocessadas e reconstruídas em nova forma. E as escrituras são rápidas em apontar isso em termos inequívocos, como no Narada-Parivrajaka Upanishad:

III-45-47. ... Esse corpo sustentado por ossos, unido por tendões, repleto de carne e sangue, coberto por pele, mau cheiroso, cheio de urina e fezes, sujeito à velhice e aflição, uma morada de doenças, susceptível de lesão, cheio de paixão, impermanente e morada dos elementos, pode ser abandonado sem pesar.

III-48. Se for para ter prazer com o corpo, que é um conglomerado de carne, sangue, pus, fezes, urina, tendões, ossos e medula, o tolo ficará muito satisfeito no inferno também.

III-49. A atitude "Eu sou o corpo" é a mesma do caminho que conduz ao inferno ...


É através do corpo e dos sentidos que nós desfrutamos dos objetos aparentes no mundo material e este é o nível mais grosseiro de identificação a que estamos propensos. Shankara descreve-o como segue, no Vivekachudamani:

88. Este corpo material, que surge de ações passadas a partir de elementos materiais formadas pela combinação de elementos sutis, é o veículo da sensação para o indivíduo. Este é o estado de vigília de uma pessoa percebendo objetos materiais.

89. A força vital cria para si mesma, de si mesma, objetos materiais prazerosos por meio dos sentidos externos - coisas coloridas como flores, perfumes, mulheres, etc. É por isso que estas têm o seu prazer pleno no estado de vigília.

Nem por um momento pense que você é o corpo. Não dê a si mesmo nem nome, nem forma. Na escuridão e no silêncio a realidade é encontrada. Nisargadatta Maharaj (I am That).

Pensando que somos o corpo, estamos dependentes de seu conforto e saúde. Se ele está com fome, "nós" estamos com fome e se ele estiver danificado ou doente, nos sentimos incompletos e sofremos em conformidade. Pior de tudo, acreditamos que quem realmente somos está condenado a envelhecer e morrer. Mais frequentemente do que não, se alguém pergunta "Como vai você?," ela está perguntando pelo estado do seu bem estar físico. Escolhemos nosso parceiro de acordo com a capacidade de atração do seu corpo e lamentamos as faculdades em declínio quando o corpo envelhece. Swami Chinmayananda comenta o seguinte sobre o verso do Bhaja Govindam, outra das obras atribuídas a Shankara:

Enquanto houver vitalidade no corpo, ainda perguntarão pela sua saúde em casa. Uma vez que a vitalidade se vá, o corpo se decompõe, e até mesmo a esposa terá medo desse mesmo corpo. (Procure Govind: Buscai Govind ...) (versículo 6)

Em suma, passar uma vida inteira em pura adoração do corpo, em ganhar mais para que esse culto fútil possa ser feito mais elaboradamente, é uma das tolices intelectuais deploráveis ​​em que a humanidade prontamente se afunda. O corpo é o altar de adoração, mas ele não vai permanecer, pois os dias de decadência e velhice não estão longe mesmo para os corpos jovens de hoje. Suar e trabalhar, lutar e obter, alimentar e reproduzir, vestir e abrigar o corpo - tudo isso é, em si mesmo, necessário, mas passar todo o tempo de vida apenas nisso é um desperdício criminoso das capacidades humanas. Pois ele em breve vai envelhecer, cambalear, enfermar e, no final, se extinguir.
Nisargadatta Maharaj explica para um investigador como não podemos ser esses corpos, que não são nada mais que a comida que temos comido, tendo crescido como resultado da concepção. Ele pede a um inquiridor para lembrar a si mesmo como um homem jovem, depois como um menino e como uma criança. Ele continua:

E antes que o bebê adquirisse seu corpo e nascesse, o que você era? Pense. O que aconteceu no ventre de sua mãe? O que se desenvolveu como um corpo com ossos, sangue, medula, músculos, etc, durante um período de nove meses? Não foi um espermatozóide masculino que combinado com óvulo no útero feminino começou uma nova vida e, no processo, passou por inúmeros perigos? Quem guardava esta nova vida durante este período de perigos? Não é aquela infinitamente minúscula célula de esperma que agora está tão orgulhosa de suas realizações? E quem pediu especialmente por você? Sua mãe? Seu pai? Será que eles qieriam você particularmente para filho? Você teve alguma coisa a ver com ter nascido para estes pais em particular?

Se você se aprofundar no assunto, você vai perceber que a fonte do corpo - o esperma masculino e o óvulo feminino - é em si a essência do alimento consumido pelos pais; que a forma física é feita e alimentada pelos os cinco elementos que constituem o alimento; e também que muitas vezes o corpo de uma criatura se torna o alimento para outra criatura.

Descubra o que é que dá senciência a um ser senciente, aquilo que, sem o qual você nem sequer sabe que você existe, e menos ainda o mundo exterior. E, finalmente, vá mais fundo e examine se este estado de ser, se essa consciência em si mesma é não limitada ao tempo. (Pointers from Nisargadatta Maharaj, Ramesh)

Estritamente falando, deve-se notar que normalmente não pensamos "Eu sou o corpo." O que realmente nos identificamos é com é um atributo do corpo, tal como "eu sou feio" ou "sou gordo." Estamos de fato equivocadamente associando as características do corpo, que não é meu verdadeiro eu com o "eu" real. Isso pode ser visto no caso daqueles que perderam um membro ou tornaram-se cego etc. O corpo pode ser mudado significativamente, mas eles não acreditam que quem realmente são é diferente.

Os cientistas, filósofos e psicólogos modernos têm escrito muitos livros nos últimos anos sobre o tema da consciência. Não existe uma teoria universalmente aceita, mas há uma tendência predominante em acreditar que a consciência de alguma forma se origina na mente, quando um certo nível de complexidade é atingido por um organismo. Uma expressão que é frequentemente utilizada é que a consciência é um epifenômeno da mente, ou seja, um efeito colateral, quase algo com que poderíamos passar sem. Assim é acreditado por muitos que a consciência é algo (seja o que for!) que está na mente, que por sua vez está no corpo. A visão Advaita é que tudo, incluindo o corpo e a mente, é uma aparência surgindo dentro da consciência (em itálico por que não se refere a consciência de um indivíduo). Este ponto de vista é expresso do modo simples por Francis Lucille, um professor moderno influenciado por Atmananda Krishna Menon e Jean Klein:

Você nunca esteve em seu corpo, então a questão de voltar para ele não surge. Seu corpo está em você. Você não está nele. Seu corpo parece para você como uma série de percepções e conceitos sensoriais. É desta maneira que você sabe que tem um corpo, quando você sente ou pensa sobre ele. Estas percepções e esses pensamentos aparecem em você, atenção consciente pura. Você não aparece neles, ao contrário do que seus pais, seus professores e quase a totalidade da sociedade em que vive lhe ensinou. Em contradição flagrante com a sua experiência real, eles ensinaram-lhe que você está no seu corpo como consciência, que a consciência é uma função que emerge do cérebro, um órgão do seu corpo. Eu sugiro que você não dê crédito indevido a esse conhecimento de segunda mão e que você investigue os dados não processados de sua própria experiência. Lembra-se das receitas de felicidade que foram dadas por essas mesmas pessoas quando você era uma criança, estudar muito, conseguir um bom emprego, casar com o homem certo, etc.? Estas receitas não funcionam, caso contrário, você não estaria aqui fazendo essas perguntas. Elas não funcionam porque são baseadas numa falsa perspectiva da realidade, uma perspectiva que estou sugerindo que você questione. (Eternity Now: Dialogues on Awareness)


Texto selecionado para estudo em Loja em 26.05.15

"Nenhum Teósofo, do menos instruído ao mais culto, deve pretender a infalibilidade no que possa dizer ou escrever sobre questões ocultas" (Helena P. Blavatsky, DS, I, pg. 208). A esse propósito, o Conselho Mundial da Sociedade Teosófica é incisivo: "Nenhum escritor ou instrutor, a partir de H.P. Blavatsky tem qualquer autoridade para impor seus ensinamentos ou suas opiniões sobre os associados. Cada membro tem igual direito de seguir qualquer escola de pensamento, mas não tem o direito de forçar qualquer outro membro a tal escolha" (Trecho da Resolução aprovada pelo Conselho Geral da Sociedade Teosófica em 23.12.1924 e modificada em 25.12.1996.

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